Do Editor ao Leitor

Caro leitor,


Quando encarreguei-me do descarte e destruição de correspondência perdida no período em que prestei serviços a uma agência de correio, o último pensamento que me veio à cabeça foi o de tornar útil aqueles pesadíssimos fardos de papel amarelado. O que mais me impedia de tomar qualquer ação era o simples sentido prático da coisa. Como destruir todo aquele papel em uma sala fechada de seis metros quadrados? Finalmente, uma necessidade fisiológica me levaria a organizar este apanhado que lhe chega em mãos. Sim, leitor, acontece que peguei no sono e acordei duas horas depois do término do expediente. Como me encontrava em uma apertada saleta esquecida aos fundos do edifício, deixaram-me lá. Eu agora me encontrava só,trancado, com fome e sem sono. Depois de algum tempo tentando, inutilmente, encontrar uma maneira de sair, desisti e comecei a ler algumas daquelas cartas, a fim de passar o tempo.
Não desejo prolongar muito minha história, e o leitor provavelmente já imagina como sucedeu o resto.
Devo ressaltar, porém, que neste opúsculo me são acreditados apenas a a seleção, edição e esta Carta cuja leitura os senhores estão prestes a terminar. Não iludo-me em considerar minha sua autoria ou frutos de meu trabalho a prosa ou valor literário contidos nos trechos relatados. Está enganado, porém, aquele que se compadece de minha história e pensa que deveria ser acreditado pela existência desta coletânea. Amigo,  a posição em que me encontro não poderia ser mais favorável ! De todas as formas, dou-me bem: se a obra for simplória, barata, malsucedida, dirão "Não tens nada que ver com isto, apenas publicastes a droga das cartas". Entretanto, se sair aos leitores como um clássico literário, o precursor de um estilo, um sucesso de vendas, dirão, após as salvas, os louros, prêmios e troféus "Como és modesto! Tome as batatas!"